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Experimentações dão cara nova ao tradicional da culinária paraense

Foto: Tássia Barros - Comus
Experimentações dão cara nova ao tradicional da culinária paraense
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Inovar com elementos tradicionais tem sido o desafio superado pela cozinha paraense

A gastronomia do estado do Pará é uma das mais originais e marcantes do Brasil e não há como ficar indiferente a tantos sabores e odores de produtos só encontrados na região amazônica. Como ainda assim, encontra formas de ser mais inventiva, a cozinha paraense, em sua melhor forma, será o centro das atenções durante o “Encontro Mundial das Cidades Criativas da Gastronomia”, no período de 7 a 11 de novembro, em Belém. O evento é uma promoção da Prefeitura Municipal de Belém, com apoio do Governo do Pará e da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

Criatividade aliada a pesquisas e estudos mostra-se, cada vez mais, o caminho correto para a gastronomia regional. Ser original não foi a principal intenção do chef paraense Artur Bestene, também conhecido como Arturzão, quando ele começou a se envolver com a culinária. O que ele queria mesmo era ser músico, e fazer carreira cantando pela noite paraense. “Tentei ser músico de várias formas. Um dia, decidi arrendar um bar para que eu fosse a principal e única atração musical do local, mas percebi que o cardápio do bar que eu havia criado fazia mais sucesso que eu. Foi quando a gastronomia passou a ser o foco principal da minha vida, e quando comecei a encarar como profissão, mesmo”, relembra Artur, divertido.

Descendente de uma família árabe, Artur já cozinhava desde o ano 2000, mas a virada foi há 12 anos, enquanto ele tentava manter paralelamente a carreira de cantor e cozinheiro. Mas o sucesso dos pratos criados por ele foi deixando o segmento musical de lado. Foi nessa época que Artur abriu a hamburgueria “Rock’n Roll Circus”, que mais tarde seria somente “Circus”, e que tinha como carro chefe do cardápio o “Jambúrguer”, um hambúrguer feito com carne de búfalo assada, castanha do Pará caramelizada e uma generosa dose de jambu cozido. “Sempre foi um dos nossos hambúrgueres mais pedidos, porque tinha esse diferencial de usar produtos regionais na receita”, conta.

“Essa tendência de usar produtos locais de outra forma, diferente da tradicional já existe há mais tempo por aqui. Quem não se lembra a primeira pizza de jambu? Atualmente, existem muitas delas por aí, mas a original continua imbatível”, afirma Artur.

Pesquisa - Com a presença da culinária cada vez mais forte em sua carreira, Artur decidiu estudar e ampliar as pesquisas que já fazia. Passou no vestibular e se formou na Faculdade de Gastronomia. “Quando você estuda e pesquisa, você passa a entender a técnica de como as coisas são feitas, então passei a trabalhar com uma gastronomia aplicada a produtos regionais, usando sempre produtos naturais locais. E foi assim que comecei a recriar produtos tradicionais e surgiram a maionese de chicória, o catchup de cupuaçu, a mostarda de tucupi e outros. Isto é, você pega a técnica de como esses produtos são feitos e vai substituindo por produtos da região. É uma desconstrução desses produtos que conhecemos há muito tempo”, ensina.

Outra área de grande interesse de Artur é a charcutaria, que é a arte e os processos de preparar produtos feitos à base de carne ou de miúdos de porco, como afiambrados, defumados, salgados, toda sorte de embutidos e salsicharia. Dessa leva, ele já criou linguiças como a de maniçoba, de gurijuba com limão galego, ervas da Amazônia e outros mais, que estarão disponíveis para consumo e vendas em um empreendimento que ele pretende inaugurar em breve.   

Nessas pesquisas de novos produtos, Artur está desenvolvendo atualmente um “Jamón de Paca”, que traduzindo, é um presunto cru feito com carne de paca, de origem certificada. “Mais uma vez, é saber a técnica de como o produto é feito e aplicar ao produto regional. Tudo tem um sentido. Na Espanha existe o presunto Pata Negra, que é feito de uma raça de porco muito especial. Fazer presunto é basicamente retirar toda a água de uma peça de carne. Então, pensei por que não usar a carne de paca? É um processo longo, que requer paciência e cuidados, mas espero que o resultado fique bom”, explica.

O “Jamón de Paca” passou por um período de quinze dias envolto em uma solução salina, quando foi ficando desidratado, isto é, curado. Em seguida, passou por uma fase de maturação de três meses, sob severo controle de temperatura e umidade. “Agora é só provar e ajustar o que é necessário, como a quantidade de sal”, disse Artur exibindo sua mais nova criação.

Nutritivo – Os produtos regionais são ricos em vitaminas, sais minerais e fibras que, se usados de forma correta, não são calóricos. “Os produtos da nossa região são em sua grande maioria muito saudáveis, e usá-los na alimentação é sempre uma boa opção. O tucupi, por exemplo, é de baixa caloria, e pode ser consumido sem grande problema, mas o açaí do tipo ‘papa’ tem mais fruto e menos água, portanto, é mais calórico. O jambu é excelente porque é um vegetal verde escuro, rico em ferro e vitaminas do Complexo B, tem magnésio, além de valorizar a nossa cultura e ser mais acessível que as outras folhas. Está sendo mostrado e constatado que o grande vilão da alimentação são os carboidratos, e os nossos produtos são pobres em carboidratos, e ricos em gorduras, mas que são gordura boa, do tipo vegetal e que fazem bem”, explica a nutricionista Jamilly Costa.

Na linha de pesquisa de produtos mais saudáveis, utilizando ingredientes regionais, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por meio do Laboratório de Agroindústria da Embrapa Amazônia Oriental (PA), desenvolveu barrinhas de cereal à base de farinha de tapioca e castanha-do-Pará, com sabores de frutas típicas da região. O produto tem alto valor calórico, já que é fonte de fibras, proteína, livre de glúten e tem potencial de mercado.

A barrinha foi desenvolvida dentro do projeto “Desenvolvimento Tecnológico para a Melhoria da Qualidade e Competitividade dos Produtos Derivados da Mandioca Provenientes da Agricultura Familiar da Região Norte”, que é coordenado pela pesquisadora Ana Vânia Carvalho e do qual fazem parte ainda Laura Abreu, Rafaella Andrade Mattietto e Alessandra Ferraiolo Nogueira.“Utilizamos na barrinha a farinha de tapioca que é um produto amplamente encontrado em vários locais. Usamos um xarope de glicose, castanha-do-Pará e polpa de cupuaçu, açaí, taperebá e muruci, tudo livre de glúten e gordura hidrogenada, e o resultado foi um produto muito energético”, explica Ana Vânia Carvalho.

As barrinhas foram submetidas a testes sensoriais com o público, que também deu opinião sobre se determinado ingrediente poderia ter maior ou menor presença no produto. “A barrinha que mais agradou ao público foi a de muruci, seguida da de cupuaçu, açaí e taperebá”, contou a pesquisadora.

Ainda dentro do projeto, a pesquisadora Laura Abreu desenvolve pesquisas sobre a adição de corantes naturais à farinha de mandioca, ou seja, a ‘farinha de mesa’, que é muito consumida no Pará. “Nossa intenção é chegar a um maior conhecimento desse mecanismo químico que dá cor à farinha, e chegar a esses corantes que vêm da própria natureza, sem utilizar nada artificial”, adiantou Laura.

Doces - A jornalista e pesquisadora gastronômica Lorena Filgueiras sempre teve fascínio pela chamada Belle Époque da Amazônia - apogeu da era econômica do comércio de borracha, nos séculos XIX e XX - e, em especial, pelo extinto Grande Hotel, hoje, o hotel Princesa Louçã. A pesquisa que ela desenvolveu buscou descobrir o que ela chama de "doces com história".

E assim, Lorena se juntou à confeiteira Bruna Garcia e ao casal de empresários Edilaine e Hamilton Garcia e juntos criaram a loja de doces “Doux du Jour”, que começou com uma página na internet e somente aceitava encomendas, mas que evoluiu para um espaço físico também. Doux du Jour, em tradução do francês, significa ‘doce do dia’.

“Nossa regra número 1 é a qualidade. Não abrimos mão de que nossos bolos, tortas e doces utilizem ingredientes de primeira linha. Mas temos os nossos segredinhos que vão desde o ponto certo de bater a massa, e isso vem de nossas experimentações e testes, que fomos ajustando até um resultado bem satisfatório”, informa Bruna Garcia, que autodidata filha de uma família, dona de peixaria no bairro da Pedreira.

O diferencial dos doces da “Doux du Jour” é que neles são utilizados produtos que não se usam mais, hoje, com tanta frequência. “Na nossa torta ‘Princesinha do Norte’, que era do cardápio do Grande Hotel, a pesquisa da receita apontou que o pão de ló, que é a base da torta, é umedecido com água de flor de laranjeira. Respeitamos a receita e usamos exatamente como ela pede. Mesmo que tenhamos que comprar água de flor de laranjeira de fora do estado, porque esse produto não é encontrado em Belém”, explica Bruna.

Nos produtos da loja, a corriqueira baba de moça recebe um toque contemporâneo que as doceiras preferem manter em segredo. “É o nosso ‘pulo do gato’ que faz a diferença”, diz Bruna. Além disso, a manteiga é selecionada, o chocolate é de uma marca da Bélgica e os corantes são de um tipo também pouco encontrado em Belém, além das frutas, como o cupuaçu, que tem um fornecedor constante e de confiança da loja.

“A ‘Doux du Jour’ resgatou alguns doces da época da Belle Époque que convivem em harmonia com a doçaria contemporânea, como os bolos Francesinha do Norte, o Antônio Lemos e o Bolonha. Doces que resgatam sabores e sensações de outros tempos, além de doces atuais. Temos sabores e bolos daquela época, além de doces das décadas de 40, 50, 60, 70, 80, como o brigadeiro, o Monteiro Lopes e salva-vidas”, informa Lorena.  

Ter uma gastronomia reconhecida mundialmente é saber também que se pode contar com a criatividade das experimentações de um chef como Artur Bestene, com o trabalho das pesquisadoras de uma entidade renomada como a Embrapa e com as pesquisas gastronômicas da jornalista Lorena Filgueiras. Esse conjunto de ações aponta o caminho de um reconhecimento ainda maior e melhor para a culinária paraense.

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