LUTA ANCESTRAL
As vozes e lutas dos indígenas que vivem em Belém em exposição na administração municipal
19/04/2021 10:09
Eles estão na universidade, na gestão municipal, na educação, na saúde e na arte. Os povos indígenas estão por toda Belém, mostrando que podem ocupar qualquer lugar nesta terra, que já foi uma aldeia, a Mairi.
“As cidades foram construídas em cima de aldeias e agora quando os indígenas vêm para cá, não podem ficar na cidade que já foi a aldeia dos ancestrais deles. Aí a gente vê a injustiça das coisas”, afirma Kwarahý Tenetehar. Formado em administração e em direito, ele está em Belém há pelo menos 18 anos e desde 2015 trabalha na Associação Wyka Kwara, que tem como objetivo acolher os indígenas em situação de cidade.
“A Wyka Kwara veio para reunir os indígenas que vivem em contexto urbano, saber das suas realidades”, explica. Através desse trabalho a associação, que reúne quase 2 mil pessoas em todo o Pará, busca a inclusão de indígenas nos âmbitos cultural, artístico, social e científico da cidade.
Políticas Públicas de Inclusão
A Prefeitura Municipal de Belém também trabalha para a inclusão dos povos indígenas na capital paraense, através da Coordenadoria Antirracista do município, criada em janeiro deste ano. “O papel da coordenadoria é garantir os direitos, as políticas públicas. No âmbito municipal ainda não tem políticas públicas voltadas para os povos indígenas, então isso é uma conquista”, conta Jomara Tembé, coordenadora adjunta da pasta.
Ela explica que a coordenadoria tem feito uma série de reuniões com entidades e associações para ouvir as demandas dos indígenas que vivem em Belém para desenvolver ações afirmativas para este público.
O município também articula ações com foco na educação indígena, principalmente para o povo Warao, que tem um grande grupo de indígenas refugiado em Belém.
“A nossa função é compartilhar a educação com o povo Warao, que se encontra em um ambiente que não é o deles. A gente está com essa nova equipe para fazer um diagnóstico, um levantamento e criar uma educação específica para o povo Warao, ou seja, um currículo próprio”, explica Wendel Tembé, coordenador de Educação Indígena da Secretaria Municipal de Educação e Cultura (Semec), que também é uma liderança indígena há mais de dez anos.
Eliene Rodrigues Putira Sacuena, indígena da etnia Baré, é do estado do Amazonas e veio para Belém estudar. Ela foi a primeira indígena mulher a se formar em biomedicina na Universidade Federal do Pará (UFPA) e destaca a importância de uma educação inclusiva. “Quando me formei a UFPA ia completar praticamente 60 anos e eu era ainda a primeira indígena a se formar. Eu acredito que as universidades, principalmente do norte do país, precisam manter esse olhar diferenciado para os povos, a interculturalidade precisa ser alcançada, ela precisa ser praticada”, enfatiza.
Os povos indígenas enfrentam uma série de dificuldades, seja na língua portuguesa, no acesso à moradia, educação, saúde pública e ao mercado de trabalho. A luta diária é sempre por mais espaço e mais respeito. "Eu não vou estudar porque eu preciso ser assalariado, o objetivo maior é romper essa barreira que diz que o índio é incapaz, que é preguiçoso, que não tem competência, que o índio não sabe de nada", afirma Wendel.
Exposição itinerante nos órgãos municipais valoriza servidores indígenas
“A sociedade precisa reconhecer que somos povos originários e que nós também somos brasileiros”, acentua Putira Sacuena. Pensando nesse reconhecimento e na valorização dos povos indígenas, a Escola de Gestão Pública, da Secretaria Municipal de Administração (Semad), leva a alguns órgãos municipais uma exposição dos indígenas.
“Como nós temos servidores indígenas trabalhando na prefeitura, que é o o local onde tem o maior número de indígenas ocupando cargos de relevância, então vamos aproveitar e fazer uma exposição na galeria da Semad, colocando algumas fotos dos servidores lá e alguns artefatos indígenas também", explica Célia Maracajá, uma das organizadoras da exposição.
Ela ressalta, que a exposição terá um sentido itinerante, vai percorrer a Ouvidoria-Geral do Município, a Coordenadoria de Comunicação (Comus), a Coordenadoria Antirracista e a Secretaria Municipal de Administração.
Essa é uma forma de valorizar os servidores indígenas e lembrar, como disse Putira Sacuena, que “a mãe do Brasil é indígena”.
Juliana Brito