Controlar a respiração e encontrar o tom certo para cada música foi por quase 30 anos a vida da cantora Lúcia Tavares, 56 anos. Estrela no garimpo do Jari, ela fez com a sua voz a trilha sonora da vida de milhares de pessoas. Mas a vida intensa e cheia de hábitos não saudáveis, levaram-na a ter sérios problemas de saúde. O diagnóstico atual é de polineuropatia, fibromialgia e uma possível miastenia grave, doenças que somam diversas consequências, como a necessidade do uso de oxigênio 24h por dia e o acompanhamento contínuo do seu estado de saúde.
É em uma pequena casa no bairro do Parque Verde, em Belém, que dona Lúcia vive hoje acompanhada da mãe, do seu notebook, aviamentos para os artesanatos que produz e uma bíblia. A “música ambiente” vem de um sonoro equipamento de oxigenoterapia. Três vezes por semana ela recebe a visita da equipe do programa Melhor em Casa, do qual faz parte há três anos e há dois recebe o oxigênio da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma). “Essa postura de chegar com humanismo, seriedade e com o desejo de ser o melhor para cada paciente no seu lar, que é o melhor lugar para um paciente viver, que é junto da sua família, trouxe para mim ressurreição e o desejo de viver”, conta emocionada a ex-cantora.
Assim como dona Lúcia, outros 22 pacientes recebem o serviço de oxigenoterapia domiciliar na capital paraense, cujo funcionamento é de responsabilidade das secretarias de Estado e Município de Saúde, Sespa e Sesma. O protocolo para este serviço vai além dos critérios clínicos para inclusão de paciente e acompanhamento pelos profissionais de saúde. “Procuramos colocar uma rotina que possibilita a convivência e a participação da família, que recebe treinamento para que possa auxiliar o paciente no uso dos equipamentos e para que proporcionem um ambiente humanizado e tranquilo”, ressalta Karen Tavares, coordenadora do programa Melhor em Casa e de Oxigenoterapia pela Sesma.
A oxigenoterapia e mais os serviços de atendimento de pacientes com esquitossomose mansônica [doença parasitária, causada pelo trematódeo Schistosoma mansoni], além do protocolo clínico para portadores de bexiga neurogênica e o papel da nutrição no cuidado da saúde mental no Caps AD, foram selecionados para a "Mostra Aqui Tem SUS", que será apresentada no XXXIV Congresso Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, que ocorre de 25 a 27 de julho em Belém, no Hangar Centro de Convenções e Feiras da Amazônia, com o tema "A saúde que queremos para o Brasil - o direito à saúde, a organização do sistema e o financiamento da política de saúde".
Como funciona o serviço?
Para inclusão de novos pacientes ao serviço, é necessário que o mesmo ou a família procure a Sesma para dar entrada ao pedido, apresentando laudo médico emitido por especialista em pneumologia da Rede de Urgência/Emergência, Ambulatorial e Hospitalar do Município de Belém, acompanhado de documentos pessoais do paciente. O segundo passo é a realização de visitas técnicas no domicílio e no hospital, realizada pela Coordenação do Serviço de Atenção Domiciliar, para avaliação e, após enquadramento do paciente nos critérios do protocolo, efetiva-se o cadastro do usuário com fonte de oxigênio indicada. “Enviamos o registro para a Sespa, que por sua vez faz o acionamento da empresa responsável pela dispensação de oxigênio e a devida instalação dos equipamentos no domicílio dos pacientes. A partir da confirmação de instalação, a equipe da Sesma realizada nova visita à residência do usuário para avaliação da adaptação, com o encaminhamento para equipes do Programa Melhor em Casa ou Estratégia Saúde da Família para avaliação e devido acompanhamento clínico mensal ao paciente”, esclarece Karen.
O Serviço de Oxigenoterapia Domiciliar foi implantado em agosto de 2016. Atualmente o município dispõe de capacidade para a cobertura estimada do serviço em 70 pacientes ao ano. “Esta iniciativa garantiu a redução da hospitalização dos pacientes crônicos que passam a ter acesso ao tratamento com a devida orientação, diluindo efetivamente a mortalidade, melhorando a qualidade de vida dos usuários”, garante a coordenadora.
Dona Lúcia é um exemplo desse cuidado. A vontade de viver hoje, mesmo com as suas limitações, é maior ainda. Cantar ficou no seu passado, mas a boa música não lhe sai do coração. “Hoje escuto o som da vida. Desde que o Melhor em Casa chegou, nunca mais voltei a um hospital para internação. Hoje faço meu artesanato, estudo idiomas pela internet, leio a bíblia e conserto roupas na mão”, conta dona Lúcia com brilho nos olhos e um sorriso cativante no rosto.