Representantes de 16 países estarão em Belém neste mês de novembro para participar do Encontro Mundial das Cidades Criativas da Gastronomia, que ocorre entre os dias 7 e 11 promovendo o intercâmbio e estimulando negócios voltados para a cadeia produtiva da gastronomia paraense. O evento reúne além de representantes da Organização das Nações Unidades para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), chefs e estudiosos do mundo todo.
Realizado pela Prefeitura de Belém, com o apoio do Governo do Estado e da Unesco, dentro da programação o grupo de visitantes vai conhecer de perto a produção ribeirinha e a pluralidade de cheiros e sabores local. Um dos pontos já garantidos nesta rota é a ilha do Combu, local escolhido por apresentar uma singularidade entre os ribeirinhos, com a produção de cacau.
Grande parte dos ribeirinhos do Estado sobrevive da produção de açaí. A produtora de cacau Izete dos Santos Costa, ou simplesmente Dona Nena, de 52 anos, foge à regra: há pouco mais de seis aplicou o aprendizado herdado do pai para produzir o chocolate 100% cacau na própria ilha do Combu.
A família da produtora sempre sobreviveu do extrativismo, mas desde 2006 ela vem trabalhando no resgate da cultura em uma área de proteção ambiental e sustentável, no quintal de sua casa. “O cacau tá presente na nossa história desde que nascemos. Meu pai plantava e extraía a semente para amassar e fazer doces pra gente”, lembra Nena, que até então apenas fazia a extração do fruto para tirar as amêndoas, as fermentava, secava e depois passava para a mão dos atravessadores.
“Depois que a gente retirava a massa para venda, o que ficava aqui por casa a gente fazia as barras de chocolate para comer. Foi aí que eu pensei em preparar uma produção artesanal com o que eu tinha no meu quintal, e isso poderia me trazer uma renda maior, mas o resultado disso foi bem mais do que esperava”, declara a produtora, que atualmente possui uma plantação de mais de 10 hectares do fruto no terreno de casa.
O chocolate de várzea fez grande sucesso e conquistou o mundo sem que ao menos a idealizadora do projeto tivesse que sair do seu Estado. Foi produzindo os chocolates e apresentando nas feiras de produtores que em certo momento o chef de cozinha Thiago Castanho, um dos mais reconhecidos do Pará, provou e aprovou o chocolate do Combu. O chef passou a servir e vender em seus restaurantes o produto que conquistou espaço em outros Estados e também outros países.
Durante o Encontro das Cidades Criativas em Belém, o grupo da Unesco vai incluir, na visita à ilha do Combu, a cadeira produtiva da mandioca e do cacau, por meio da Trilha do Chocolate, programação que é promovida por Nena. “O Encontro tem essa função, impulsionar toda a cadeia produtiva do setor gastronômico, desde os pequenos produtores de insumos orgânicos, as indústrias processadoras e exportadoras de alimentos, até chegar às mesas de bares, restaurantes e hotéis. A Nena é um grande exemplo de pequenos produtores que expandiram seus conhecimentos e romperam fronteiras até mesmo do País. Com isso nossos visitantes vão ter a oportunidade de vivenciar a experiência da vida ribeirinha”, destaca o coordenador do Comitê Cidades Criativas da Unesco, João Cláudio Klautau.
Tour pela ilha - Os convidados terão a experiência que os ribeirinhos têm diariamente, quando atravessam a cidade pelos rios. Na ilha, a recepção promete ser tão saborosa quanto à que a Nena faz aos domingos, para quem faz passeios turísticos na ilha. Café da manhã regado a bolo, tapioca, chocolate quente, chocolate de colher, tudo feito com produtos da própria ilha darão as boas-vindas.
A produtora, além de anfitriã, é a guia turística que leva os visitantes pelos caminhos da trilha que dura cerca de duas horas de caminhada. No trajeto, ela conta sobre o trabalho de plantio e colheita do fruto, e todo o processo artesanal do cacau até virar o chocolate. “A ideia desse passeio é mostrar nossa rotina como ribeirinho e o trabalho artesanal da produção de chocolate que tem mantido o sustento das famílias que trabalham nesse extrativismo aqui no Combu”, afirma.
A família da professora Márcia Homci, 43 anos, fez este passeio durante um final de semana com o intuito de conhecer mais sobre a própria cidade. “A gente gosta de explorar o novo, mas principalmente aquilo que ainda está dentro do nosso território. Faz bem conhecer a cidade em que se vive. Vai despertando o interesse na gente de entender como ela (Nena) chegou a este produto final fascinante. Digo com toda certeza que a trilha é melhor que muito videogame e computador na vida dos meus filhos. O conhecimento que a Nena transmite, dificilmente vai ser encontrado em uma busca na internet”, assegurou Márcia.
Durante as horas de conversa, os visitantes vão conhecendo, definitivamente, os motivos pelo qual Belém entrou para a lista das Cidades Criativas da Gastronomia, da Unesco. “Belém é rica de tanta coisa, de cultura, saberes, gastronomia, é uma imensidão de conhecimentos que a gente só tem o prazer de conhecer quando se dá a oportunidade de participar de momentos como este. O que essa produtora, natural do Combu, faz de maravilhoso com o saber herdado de família é incrível. Isso deve ser um dos motivos pelo qual somos referência na gastronomia”, declarou a arquiteta Baviera Madureira.